quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

As palavras não saem. Ela tenta desesperadamente encontrá-las mas a imaginação esvaiu-se. Nada soa como antes, nada lhe parece fácil como o era. Vê letras, ou talvez sejam apenas imagens, não as consegue distinguir, reconhecer, relacionar. A sua mente está ocupada por uma imagem de água lisa, água parada, de um azul escuro. A água inerte não reage, tal como ela não o faz. Sucedem-lhe imagens confusas, de situações passadas, de possíveis futuros.
Uma pena suave pousa na superfície plúmbea da água criando automaticamente pequenas ondas circulares, que se espalham em toda a extensão do seu pensamento... Algo mais. Uma pequena pedra precipita-se sobre a água, caindo num splash agudo, que perturba o silêncio da sua mente incapaz de produzir sons, incapacitado de produzir palavras, impossibilitado de pensar de outra forma senão por imagens.
A água rapidamente recupera da agitação momentânea e ela regressa também à sua insignificante existência, sem palavras, sem nada.
Tenta falar. As cordas vocais parecem não reagir, mas na realidade ela apenas não sabe o que dizer, vê-as mas não sabe como expressá-las na linguagem mundana que conhece desde sempre.
Um pouco mais de esforço. Vê novamente a água. Desta vez, porém agitada por uma forte ondulação, uma melodia que se assemelha ao mar. Mar. A primeira palavra que recorda. As letras afiguram-se-lhe como seres, seres magníficos que agora não lhe parecem estranhos.
Imagina no mínimo quão absurda é a situação em que se encontra, praticamente incapacitada de pensar pois desconhece as palavras necessárias para tecer os juizos de valor e as ideias que constituem o próprio pensamento.
Aos poucos a movimentação vai abrandando até fluir lentamente, num leito invisível, com uma calma inalterável e constante... E aí as palavras começam a ressurgir, quando se resigna perante tudo o resto que lhe cruza a mente, imagens de momentos que perdera, arrependimentos que não queria ter, pessoas que deixara para trás.
Quando as palavras regressaram na maioria, foi capaz de pensar, e  o seu primeiro pensamento foi óbvio, para mim, não para toda a gente.

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