terça-feira, 8 de junho de 2010

too much water

Chove. Chove imenso. Gotas imensas que cobrem tudo com um brilho metálico da água, reflectindo o azul celeste e também a podridão das ruas, o cinzento que povoa o que a rodeia.
Não consegue correr para fugir a tudo isto, mas se o pudesse fá-lo-ia. Arrasta os pés pelo chão coberto de folhas esmagadas pelo milhão de pés que antes dela tomara aquele caminho.
Sente a roupa cada vez mais pesada, os seus passos cada vez mais curtos e lentos, um ritmo mais lento, uma dificuldade de movimentos, provocada pela chuva incessante.
Tinha a visão reduzida a uns metros à sua frente, e mesmo assim não havia nada que ansiasse ver, muito menos alguém.
Esforçava-se por apagar as suas memórias por instantes, para que pudesse deslizar na leveza do seu próprio ser, sem arrependimentos e sem nada, vazia apenas por segundos, ou até minutos, mas oca para conseguir encarar o reflexo que a água continuava a reflectir e que ela apagava violentamente agitando o tapete de água que se estendia à sua frente.
Alguém lhe abriu uma porta, uma porta que ela deveria conhecer, mas que não reconhece.
Entra numa divisão que reconhece como um sítio onde guardou as suas memórias mais escondidas mas continua sem saber onde está.
Atira-se para a cama ainda desfeita, aninhando-se em si própria, com a cabeça apoiada em duas grandes almofadas. Ainda consegue ouvir a chuva e parece-lhe tão nítida, sente que também chove através do tecto sólido acima da sua cabeça. Porém era uma chuva mais fria, mais pesada, que a arrasta para o fundo. Recolhe-se nos seus pensamentos e nas memórias que permite a si própria recordar.
Chora. Chora imenso. Lágrimas que cobrem toda a sua face com um brilho metálico e aquoso, reflectindo o branco das paredes e a podridão da sua própria pessoa.
Inunda toda a divisão com as suas lágrimas e adormece na divisão fria e molhada, mas pelo menos enquanto sonhar tudo aquilo vai desaparecer, toda a água excessiva, talvez encontre finalmente um equilíbrio, no entanto antes de entrar no transe do sono recorda que não pode mudar o descontrolo do seu canal lacrimal, muito menos a sua sensibilidade excessiva, e de que serviria isso?...

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