quinta-feira, 6 de maio de 2010

just a girl

"As pessoas continuam a cruzar-se com ela, a olhá-la de lado, enquanto ela permanece impassível, encostada com o seu caderno, a rabiscar palavras numa letra imperceptivelmente diminuta.
Consegue imaginar os pensamentos das pessoas que continuamente a olham, a sua indiferença e por vezes a sua tentativa de a compreender, de a tentar retirar daquele pequeno mundo que ela criou para si própria.
Mas é quase impossível tentar superar algo tão próximo da perfeição, o seu mundinho a preto e branco como nos filmes antigos, com laivos de cores primárias a enfatizar determinados momentos, leves pinceladas de uma matiz diferente da habitual para fugir a monotonia.
E este mundo tem uma banda sonora apenas sua, melodias docemente tocadas em piano, algumas vozes recriadas pela sua mente, trauteadas quase que insonoramente pela sua garganta...
Há muito tempo que não deixava ninguém entrar no seu mundo, fartara-se de tentar, de se esforçar, quando não recebia o mesmo em troca. Deixou-se levar pelo hábito de permanecer sozinha, mas não conseguie tolerar os mesmos lugares por muito tempo, apenas um. Uma cerejeira enorme, despida durante quase todo o ano, com uma copa larga, um tronco modelado na medida certa ao seu corpo esguio. Encaixava na perfeição ali, e não permitia que ninguém perturbasse a harmonia destes momentos, que lhe usurpasse o seu regúfio, o seu lugar térreo, aquele que apenas ela conhecia e que nunca mostraria a ninguém. Não. Nunca é uma palavra demasiado definitiva para uma forma de viver como a dela. Prometera a si mesma que nunca diria nunca.
Mas a realidade é que vivia demasiado separada da "realidade", não estava preparada para regressar a um lugar repudiante, que se esforçava por não a compreender, e por mais estranho que parecesse estava feliz, ali, no seu mundo, consigo mesmo, com relacionamentos ocasionais, não se prendendo demasiado a ninguém, perdida entre a realidade e a ficção, num interface mágico e seu, acima de tudo seu.
Ao sair de casa, fugia da realidade instável que era a sua "casa" e corria desesperadamente depressa para a sua casa, para o lugar onde se sentia protegida, entre as raízes sobredesenvolvidas de uma árvore centenária, ou talvez nem tanto, mas que ela gostava de imaginar como tal.
Escondia-se e limitava-se a observar... A erva verde, as folhas de orvalho delicadamente pousadas aleatoriamente em quase todas as folhas, numas gotículas perfeitas que continham o mundo e o espelhavam ao mesmo tempo. Passou horas a observar uma borboleta que ondulava delicadamente pelo ar. Não conseguia desviar o olhar das suas cores, dos tons alaranjados, dos castanhos, das nuances, das suas particularidades, da sua beleza simplista, do seu destino, da sua vida curta...
Entercortadamente olhava as crianças que a olhavam e sorriam, as suas brincadeiras inocentes, a forma como viviam e não tinham necessidade de medir as palavras que diziam, num mundo em que um "gosto muito de ti", um "nunca" e até um "amo-te" não têm repercursões porque são verdadeiros mediante os seus parâmetros, quando os anos passam a situaçãos complica-se até se atingir a altura em que cada palavra é calculada, cada gesto mecanizado, cada situação estudada... E os seus pensamentos ondulavam com a brisa, tentanto afastá-los de "casa", orientando-os para o essencial, para o que era realmente seu..."

(talvez continue mas não tenho inspiração para o terminar)

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