Sinto-me dividida... Tenho diversas facetas e temo que ninguém me conheça realmente, saiba quem é a pessoa que está cá dentro, que sofre com as palavras mais simples e por vezes consegue suportar as frases mais duras.
Temo que apenas mostre uma parte de mim a cada pessoa, a parte que essa pessoa consegue perceber de mim, cada um dos fragmentos da minha personalidade são entregues a uma pessoa, a um amigo, para que o acarinhe, proteja e compreenda. Há pedaços que ainda mantenho comigo, esperando encontrar a pessoa certa para os partilhar.
Talvez apenas uma ou duas pessoas me tenham visto sem artifícies, sem maquilhagem, sem nada a encobrir-me, a ocultar-me, a realidade dura da minha fragilidade e simplicidade... Apesar de chorar muito, muito poucos viram as minhas lágrimas, muito poucos foram aqueles com quem chorei apesar de ter secado muitas lágrimas com a delicadeza das minhas palavras e a preocupação genuína que nutro pelos que me importam...
Talvez eu não seja assim tão diferente das pessoas que critico, talvez esteja a afastar-me como toda a sociedade de nós próprios, do mundo, das pessoas... Talvez me esteja a concentrar dentro de mim própria, guardando-me fechada no interior de mim mesma.
Já sofri, já me magoaram, e gostaria de poder dizer que o ultrapassei mas fiquei marcada, marcada com cicatrizes profundas na minha alma, que mudaram a minha forma de ser de forma praticamente irreversível. Houve alturas em que me senti impossibilitada de amar, e para alguém como eu, com necessidade de confiança e partilha esta perspectiva é horrível, a falta de cofiança nas pessoas, a necessidade de me esconder para que as pessoas não se aproximem e me magoem mais uma vez sem se preocuparem com as consequências dos seus actos pueris...
Já me senti só, abandonada pelos que importavam, pessoas que partiam para provavelmente nunca mais voltarem, apenas as veria em mínimas visitas, acabando-se os jantares sem planeamento prévio, as gargalhadas espontâneas nos intervalos, a noção de estar a 5 minutos de um abraço, a possibilidade de um jogo de ténis, um passeio apenas porque sim...
Senti que os que ficaram não percebiam a minha perda, me deixavam para trás sem se preocuparem em perceber a tristeza que eu tentava ocultar (ou não) com um sorriso, continuavam a viver deixando-me para trás, meia morta, meia viva, desamparada, perdida, no meio de nada, num turbilhão infinito de emoções, de sentimentos contraditórios, de procura de culpados para o que acontecia com ela, com ele, para tudo, para nada, para a vida, para a razão porque continuava ali deitada no chão embargada nas minhas próprias lágrimas silenciosas, no choro que ninguém tentava ouvir, na súplica por compreensão e apoio.
Eu precisava de alguém e ninguém veio, todos se afastaram, tentei lidar com os problemas sozinha e aí surgiu a verdadeira necessidade de escrever, de enfrentar as situações sem limitações, de ver o que se passava dentro de mim sem barreiras, de me entender sem a ajuda dos outros...
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Aí comecei a afastar-me do mundo mas a aproximar-me do mundo para poder mais tarde, quem sabe, voltar a ver o mundo de igual forma.
Chorei todas as lágrimas que tinha para chorar, lágrimas frias, duras, que me magoavam, o coração doía, os olhos maltratados por verem a dor que me cercava, os ouvidos consolados por melodias agradáveis e um pouco melancólicas a meu ver na altura, como Chopin e Yann Tiersen.
Chorei, fechei-me no meu interior e encerrei os meus problemas bem fundo depois de os enfrentar, quando aceitei a realidade que não estava só e que se o estava apenas me podia culpar a mim senti-me a renascer, a florir, a acordar depois de uma noite longa e tenebrosa, de um pesadelo, de nada mais que um sonho mau que ficou para trás...
Agora posso dizer que estou feliz, que me sinto melhor, ainda estou a tentar melhorar, a aprender a entregar-me, a temer menos, mas estou a chegar lá, estou a lutar para ser a pessoa que quero ser, e que serei... um dia, num dia próximo. Perdi-me pelo caminho mas voltei a encontrar-me.