Uma batida ao de leve na porta. Um baque surdo e seco que mesmo assim a desperta do seu sono leve.
Arrasta-se lentamente pelo corredor, com o cabelo desgrenhado, envolta no roupão, com o sono estaqmpado no rosto e presente nas covas profundas abaixo dos olhos.
O soalho range à medida que ela cuidadosamente pousa os pés descalços nessa madeira velha e gasta por todos os pés que já a percorreram, quem sabe também numa situação destas.
Ela tacteia na escuridão, sentindo o frio húmido que reveste as paredes. Caminha lentamente tentando não interromper o sono dos restantes habitantes da casa e para fugir à possibilidade de embater em algum obstáculo, forçando a sua visão a penetrar a escuridão da casa.
Teme que o visitante possa já ter partido. Não sabe.
Estende os braços em direcção ao lugar onde julga estar a porta mas engana-se. Caminha um pouco mais. Cada vez mais impaciente por não alcançar aquilo que quer caminha mais depressa, mas o seu corpo, a sonolência que o entorpece atrasa involuntariamente os seus movimentos, deixando-a revoltada, consigo mesma e com a teimosia do seu corpo.
Nos seus pés descalços sente uma brisa fria. Pára. Está próxima da porta. Pousa o ouvido suavemente na porta na esperança de ouvir a respiração do seu visitante. Silêncio. Espreita pelo óculo da porta e não vê nada.
Destranca a porta, esforçando-se por diminuir o ruído metálico do trinco. Roda a maçaneta escurecida da porta de carvalho e puxa a porta. No breve instante em que lhe cabe imaginar as mil e uma possibilidades que dali podem advir, a presença (ou não) da pessoa que espera, a possibilidade de umas mãos cruéis surgirem da escuridão do corredor e a puxarem para dentro, cruzam-lhe o pensamento todo o tipo de situações absurdas, algumas agradáveis, outras não.
Abre finalmente a porta e as suas pupilas dilatam-se perante a claridade da rua, iluminada apenas pela lua. O corredor é inundado pela brisa fria da noite, que traz o cheiro a Verão já presente no ar, assim como o assobio melódico do vento por entre as folhas.
A soleira da porta está vazia, ele já não está ali, desistiu de esperar. No alpendre encontra uma única orquídea rosa delicadamente pousada no primeiro degrau da entrada e com ela uma promessa sussurrada ao vento de um regresso futuro, assim como um beijo escondido nas pétalas da flor.
Nada mais que desilusão. Sai e com uma agilidade inusitada agarra a flor. Olha mais uma vez em volta prescrutando o vazio, procurando algo, esperando vê-lo, mesmo assim.
Uma gota de chuva cai precisamente no canto interno do seu olho esquerdo. Pestaneja instintivamente e essa gota escorre-lhe pela face como se fosse uma lágrima sua.
Uma chuva torrencial que a cobre de água. Não foge. Não chora. Não reage. Completamente impassível perante o que se desenrola em seu redor.
O odor a terra molhada impregna o ar e ela fecha os olhos.
Dirige-se para a porta que deixara entreaberta. Um último relance do olhar, por cima do ombro. Ele devia estar ali.
Arrasta-se pelo corredor. Não sabe se fechou a porta mas também não importa.
Deixa, durante o percurso, um rastro de de água pluvial ou de lágrimas, talvez uma mistura indistinta de ambas. Regressa à divisão de onde partira, ao vazio e à sombra.
Olha pela janela. Já não chove. Olha o céu mas não vê nada.
Corre deseperadamente para a rua, escorregando na água que deixara pelo caminho. Num longo suspiro fecha a porta.
Magoa os pés no empedrado da rua mas não importa.
Corre pela rua, com a orquídea na mão. Precisa de ver o céu, vê-lo realmente.
Um autocarro pára à sua frente. Entra.
O motorista observa-a, o seu cabelo desgrenhado a pingar apesar de não chover já, os pés descalços, a orquídea, a camisola larga que rapidamente agarrara.
"Menina, algo me diz que não devia estar aqui."
"Não devo estar em nenhum lugar específico por isso não importa onde estou."
Wow, adorei x)
ResponderEliminarContinua ;D
Andreia AMEI !!! :D
ResponderEliminarLindo... adorei!
ResponderEliminarBeijinhos